sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

PS


A última página restará rasgada.

Ficará apenas uma asa,
incompleta, sem seu par.

A outra levo comigo.
Com esta meia página
combino mais.

Deixo a outra
aos que toleraram o enfado.

Meia página, uma asa
parte de todos nós.

Juntem os olhos da criança,
à flor da quaresmeira.
Juntem as páginas que me dei
às suas páginas,
e voem em paz.


(Verdes Versos)


À todos um abraço e meus agradecimentos neste primeiro ano do "Estalo da palavra".
Agradeço o estímulo dos que deixaram seus comentários bem como àqueles que, em silêncio, leram meus poemas e, de alguma forma com eles se identificaram.
Vamos buscar nas crianças e na natureza uma razão, um estímulo, para nos mantermos conscientes e ativos nesse absurdo que é a vida.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Claro enígma


Cada manhã traz consigo uma nova geografia.
Deve-se, então, ver as nuvens
para entender os dias.




(O estalo da palavra)

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Frango com farofa


No fim de semana
estendo o pano xadrez
no céu de pólvora;

arregalo o olho
para entrar o cisco;

uso a cara de bobo
e ignoro o vício;

O pano xadrez – início;
o cisco no olho – chuvisco;
na cara de bobo – o riso.

(O estalo da palavra!)

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Rubem Braga


Rubem Braga morreu às 11h30 da noite de 19 de dezembro de 1990. Estava absolutamente só em seu quarto – como exigira dos amigos e dos médicos que o atenderam. Suicídio? Eutanásia? “Suicídio assistido”, é o eufemismo mais utilizado, nesses casos.
Deixou-nos uma obra maravilhosa, uma prosa poética única, intimista, na qual tratava das pequenas coisas que nos circundam, as quais, cada vez mais, nos passam despercebidas. Uma homenagem ao nosso cronista maior.


Quintana, em seu poema-homenagem à Tolstoi escreveu que “ a morte é uma locomotiva que chega sempre pontualmente na hora incerta”...
Assim não o quis Rubem Braga.

Segue abaixo um trecho de uma de suas crônicas, citado na recente biografia cuidadosamente preparada pelo também capixaba Marco Antônio Carvalho.


Hoje venta noroeste, amanhã é lua cheia. Depois virão outras luas e outros ventos, mas isso também é fútil. Pois um dia as luas podem girar no céu e os ventos rodarão na terra com meiguice ou fúria, e isso não te importará, como, também, tudo o que foi. Por que, então, te afliges, agora? Que a brisa do mar invente espumas, e depois venham as chuvas frias, o sol e depois no céu limpo suba, imensa, a lua – não penses que isto tenha nada a ver contigo. Não existes. Nada tem a ver contigo.

(do livro – Rubem Braga – Um cigano fazendeiro do ar – Ed. Globo)

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Ciclos


E esse Sol
forjando o imponderável
na bigorna do horizonte

E essa Lua
intangível
com suas promessas de sonho

E esse momento
em que nos aproximamos das brumas ...


(O Estalo da palavra)

quarta-feira, 22 de outubro de 2008


Levem-me as horas
para os caprichos mundanos!

Já destaquei a etiqueta.

Tomei posse do indivíduo.

Será que não vêem em meu
ante-braço o carimbo de “pago”?

sábado, 11 de outubro de 2008

Zé das Virgens





Zé das Virgens –
um despirambado!

Sempre com
respingos de aurora
no olhar.

Ao longo dos anos
ninou a menina Maria,
adormecida pelo cheiro da cola

(deu-lhe o nome
de Maria das Nuvens).

Zé das Virgens
desposou Maria das Nuvens,
debaixo de uma marquise,
num dia de tempestade.

Muito, de tudo,
ele ofereceu
para sua amada:

Deu-lhe
às águas do mundo,
às pétalas das rosas,
os sons das ondas,
o ruído das asas dos colibris.

Pediu-lhe apenas
a escuridão de sua boca.
(sumidouro do mundo)
Para onde partiu
deixando de lado
a eternidade.


(Breves palavras)

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Carta ao jovem Nietzsche


O fino trato
que despendes com tua escrita
não merece o desfastio
dos ascetas.

Poeta,
mantenha léguas
do itinerário dos justos.

O verso
que te arde as conjuntivas,
que faz suar as mãos sobre a mesa,
desgosta os santos.

Lembre-se que
gostariam de te estirpar
os olhos mas
te presenteiam com um sorriso.

Sempre soubestes
que poderias contar
com teus inimigos
(os bons e justos tudo temem)

Poderá existir alguém
mais fiel que um inimigo?

terça-feira, 16 de setembro de 2008

RÉGUA QUEBRADA


Não me importo
em numerar as penas do cisne.

Versejo
com apetite.

Cato palavras de aluvião.

Sou sapo de língua comprida catando mosca.

Insisto na ingenuidade da metamorfose
(só sei transformar sapato em borboleta).





(O Estalo da palavra)

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

PIRAÇÃO


Eu já lhe disse que
se você sentasse no céu
eu iria ficar o tempo todo empinando papagaio?...

(O estalo da palavra)

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Pressagio


Chegará o dia em que de tanta querença, o mar chegará às praias, às portas, às casas... E aqueles que tanto por ele brigaram, não terão êxito em desfazerem-se de tão insistente amante!

(O estalo da palavra)


Kioto


A redoma estilhaçada
faz frágil o ser antropocêntrico.

A névoa, agora, é cinza de morte.
A hora se apresenta túrgida de desassossego.

O suor que nasce e evapora do febril pensante
é quente, como no Holocausto de ontem.

A vidraça,
o vapor,
a névoa,
sobretudo o calor,
fundem o metal encantado de Wall Street,
em pleno Sol de meio-dia.

É o céu um espelho partido,
forjado por todos os alquimistas que acenderam o fogo da ambição.

O girassol torporoso,
refugia-se entre as pétalas
que não tombaram
ao orvalho ácido do alvorecer.
Ele é incapaz de encarar
a verdade deste Sol.

O que dizer dos seres ignotos
que se admiram nos espelhos das nuvens...

Onde está a cuspideira,
para que eu possa comemorar a soberba humana?

Homem,
mosaico de fluidos,
senhor dos pensamentos dúbios e incoerentes,
não tardes esperando que tua racionalidade te dê o norte.
Ouve os ociosos que, perdidos entre estrelas,
antevêem o simples fim.

A rosa oriental
que nasceu aos pés do cogumelo de poeira,
já era rubra, ao brotar.
Hoje,
ganhou um toque tropical,
está mais encarnada,
herança diária
dos inocentes exangues,
que teimam em nascer,
à margem do mundo globalizado.

Os seres débeis já se esvaem
na fumaça que escreve números
em todo o céu.
E o principal protagonista
não lê os escritos das ondas,
que, insistentes,
desistiram de lavar as areias
e passaram a deixar os seus escritos,
nas memórias de uma geração

(Verdes versos)

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Circo


Eis aqui minhas duas mãos.
Queres que eu te empurre?

Passa por cima
do ar parado
e repisado pela platéia.

Ignora a apnéia coletiva.

Desaloja o quebranto desses olhos.

É falsa a força que te sustenta.
Essa verdade não resistiria ao primeiro espasmo
da tua carne.

A poeira é a pele da lona
(a tua pele),
despida por todos após o último aplauso.

Vai,
abandona os holofotes!

Vai!
este é o momento.

Não se avexe,
que as bestas despidas
são inofensivas.




(O estalo da palavra)

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Iluminuras


I


A vida;
esse diário de olhares.


II

E nós que já não
nos vemos nos olhos.


III.

Mas como perder de ver
esse seu jeito de vestir despindo-se
ilustrando de verde a manhã das decrepitudes.


(O estalo da palavra)

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Cúmplice


Não trairia
esse dorso
por mais que pudesse

Deixei que o cheiro
perdido em sua nuca
retardasse o amanhecer.

Enquanto dormias
desfiz os gestos
de seus arroubos.

Não trairia
esse gosto
por mais que quisesse.

Já coloquei
todos os parênteses
em nossa existência.

A porta ficou fechada
para a monotonia
da brisa.

O sol aqui
desfiou a esteira sob a areia
para que queimássemos os pés.

Não trairia
esse gozo
por mais que esquecesse

Aprendemos juntos
a revirar as gavetas
e destronar deuses.

A tradição dos dias
tropeçou no tapete
da entrada de casa.

Não trairia
Esse rosto
por mais que envolvesse

Na casa
cada crime
vira papel de parede

Os filhos aprenderam
sobre a mentira
de alguns beijos.

Não desperdiçamos
intenções
no café da manhã.

Não trairia
esse furor
por mais que sofresse

Aprendi
a usar um olho
para revolver o chão.

Testamos a saúde
celebrando
verdades prematuras

Não sobra
espaço entre as mãos
que se apertam



Por essas bandas
a luz não veste
cor de monotonia.

Não trairia
esse momento
por mais que vivesse.



(Para não dizer que não falei...)

domingo, 29 de junho de 2008

O que se vê


Pela fresta estreita em que me permito ver a vida,
insiste em me turvar a visão
esta névoa contínua das minhas incertezas.
O lugar no horizonte o seu próprio nome diz...
Vejo apenas uma fração do nascer
ou do porvir da existência.
Se claro, vejo pálido; se escuro, aí vejo tudo.
Tão limitada é a consciência dos seus limites
que, como um asno, se permite tampar os olhos
para trilhar seguro seu pedaço na história.






(Verdes Versos - 2003)

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Lente


Era outono...

Duas meninas
deixaram suas casas para trás,
na lonjura da esquina.

Eram crianças...
No pires dos olhos
ainda não transbordara a mentira;
ela apenas rodopiava...

E por não bastar o milagre
da inocência;

era outono...


(Para não dizer que não falei...)

terça-feira, 20 de maio de 2008

Rotina


Convivia-se com a conformidade
de ter o universo próximo de casa.

O espaço delimitado
pelo absurdo traço da conveniência
era marcado pelas solas dos sapatos.
(que trazia a fotografia do mijo fora da privada)

Para o gozo
O número era par.

De pouco importava a singularidade da morte.





(Para não dizer que não falei...)

terça-feira, 6 de maio de 2008

Artifício poético


Pendurar um cordão de guilhotinas no pescoço.

Sentir um certo distanciamento dos perdulários(...)
que ensaiavam roubar-nos o deslumbramento do olhar.









(Para não dizer que não falei...)

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Identidade



Busco um poema
de que quando lido
se perceba nas mãos a densidade.

Que aproveite
O tato refinado dos artelhos,
e a sensibilidade imaginativa dos pentelhos.

Que tenha um visgo,
Que grude por toda a eternidade
as borboletas no céu.

(Verdes versos)

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Máscara


Delírios postados,
por um cem número de pernas,
partiram levando a missiva
que entitulei-me: deus.

E a palavra estalada,
em permeio a dissonância
da revoada dos pombos,
tripudiava com a insanidade
dos outros deuses.

E eles,
surrupiados do direito uno
e tresloucados
diante da retirada das máscaras,
(entre trejeitos e suspiros)
denunciaram minha loucura.


(Para não dizer que não falei...)

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Criação


Lavar a calçada,
no alvorecer do dia.
Espalhar os lápis de cera
e dizer ao teu filho:
– Cria asas!
Mas o pontilhado da história
é pragmático e se reapresenta retinto.
A falsa aleatoriedade do traço
traz o conteúdo da sombra.
O ignoto treme pela vida,
sob a dureza do concreto.


(Verdes versos)

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Cyrano de Bergerac


Admirai-vos de que essa matéria, misturada confusamente, ao sabor do acaso, tenha podido constituir um homem, visto que havia tantas coisas necessárias à constituição de seu ser, mas não sabeis que cem milhões de vezes essa matéria, avançando no sentido de formar um homem, ora deteve-se a formar uma pedra, ora o chumbo, ora o coral, ora uma flor, ora um cometa, pelo excessivo ou demasiado pouco de certas figuras que ocorriam ou não ocorriam nesse processo de formar um homem? Não é nada de espantar que, em meio a essa infinita quantidade de matéria em constante movimento e alteração, tenha havido a criação dos poucos animais, vegetais e minerais que conhecemos; como não é de espantar que em cem lances de dado ocorra uma parelha. É portanto impossível que daquele revolutear não se fizesse alguma coisa, e essa coisa será sempre admirada com espanto por um doidivinas qualquer que ignore quão pouco faltou para que ela não se fizesse. (Voyage dans la lune – Cyrano de Bergerac)

“Se pensarmos que essa peroração em favor de uma verdadeira fraternidade universal foi escrita quase cento e cinqüenta anos antes da Revolução Francesa, veremos como a lentidão da consciência humana em sair de seu parochialism antropocêntrico pode ser anulada em um momento de invenção poética.”

In Ítalo Calvino. Seis propostas para o próximo milênio. Companhia das Letras, 1990. (Lezioni americane – Sei proposte per il prossimo millennio, 1988)

sábado, 22 de março de 2008

A realidade de cada um


Desconheço a ordenação dos anjos,
mas sei das cores nas fachadas das casas.

Na foto antiga, as casas já receberam
O insofismável tom trazido pela areia do tempo.
Naqueles olhos ausentes,
que cruzaram desapercebidos
a falsa eternização do momento,
surpreendo o olhar humano.

Desconheço a verdade dos santos,
mas tenho aprendido sobre a mutilação do desejo.


(Verdes Versos)

quinta-feira, 13 de março de 2008

Raízes


Era quase ódio
entornado
naquele olhar

lento. Lento
como morrer de câncer.

É que definharam os dias;
e a vida
não passou de provocativas raízes
que se alimentavam de culpa.

O que brotou,
brotou para dentro.

(Verdes Versos)

domingo, 2 de março de 2008

Beijo


Quero comer a tua boca,
para misturar nossas palavras.

Quem sabe assim,
com as frases embaralhadas,
voltemos a criar caminhos.


(Verdes Versos)

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Fogo baixo


Eu já te disse da espera?
É como pescar traíra:
arma-se a vara na véspera.
Não se tem a consciência
de que o que vem é o que
resolvemos chamar de futuro.
Mas o quão irrelevante
é para o relógio astral
um dia que segue outro.
O importante é o prazer da espera,
a transformação do tempo
na demora que relativiza a vida.
A espera permite fixar o momento;
sobra tempo para se enfeitar com o luar.
O fim passa a ser justificável,
E, quando ele chega,
eis que nos encontra já entranhados
com o cheiro da partida.

(Verdes versos)

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Poetas – Rita Brennand

Vários poetas nos dizem muito.
Alguns deles são conhecidos de todos, outros de muitos e a grande maioria de muito poucos.
Mesmo aqueles, já nossos velhos conhecidos, possuem inúmeros poemas por nós desconhecidos, não lembrados – ou simplesmente não lidos no dia oportuno para sua leitura.
Resolvi então, iniciar a postagem de poemas que tem me acompanhado ao longo dos anos.
Inicio com Rita Brennand, artista plástica e poetiza, que com seus 80 anos muito me emocionou. Seu único livro, Objetos da Terra, editado pelo poeta e contista Miguel Marvilla em 2001, permanece ainda inédito.

Criação
Estava tão conivente com o cubo
que me encubei numa tarde molhada.
Encubada, teria mais tempo para mim.
Já não cabia a idéia solta, descentrada.
Previ a cabeça enquadrada.
Liguei com o olhar os pontos dos cantos
com linhas retas raciocinadas.
Teci por horas a fio,
e vi-me de cubos ao cubo cercada.
Até que, em negro ponto, senti-me.
Sou energia contida, concentrada.


Estou à espera do big-bang.


Para não morrer

Para não morrer,
eu me pari como fazem as vacas
em qualquer campo.
Era de noite, de céu branco de via-láctea,
era de noite, de luz.
Dançava no pasto os vaga-lumes.

Eu me pari ao som do cria-criar
dos grilos.
Me parindo,
eu vim a tona,

me lambendo,
me respirando,
me cri-criando!

Era de noite.
Para não morrer,
eu me pari.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

14 de Fevereiro, blogagem coletiva contra a pedofilia



Coito


Seu moço,
qual é mesmo seu nome?
Tá, tá bom!
(alguém entrou em meu beijo)

Essa vida de becos escuros,
bueiros fedorentos,
é uma merda,sabe?!
(alguém rasgou meus peitos)

Abro as pernas
pra ter o que comer.
Tô viciada, mas
tenho minha dignidade...
(enfiou em minhas coxas)

Te chamar de meu amor?!
Vai meu amor!

Dizer que sou sua puta?
Enfia na sua putinha,
Assim... assim...
Enfia nessa merda
de vida dessa puta!

Seu nome é Wanderley?!

Wanderley, deixa eu morrer Wanderley!

(Para não dizer que não falei...)

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Lavrar a carne


Desacato curvas
às expensas da vereda de teus olhos.
Bolino esse olho d´agua
bebericando-te pelas margens.

Brinco de adivinhar desvios
enquanto procuro à nascente de tudo.

Não me agrada a mesmice
de seguir margeando o leito.
Prefiro ir redescobrindo atalhos...
Sou grilheiro,
gosto de tomar posse do que há de devoluto.

Por onde sigo,
sinto o crepitar dos seixos
e o tilintar dos ossos.

Marco com saliva meus passos.

Comungo com a cuia das mãos os teus cristais.

Ah, esse calor calcitrante...

Que venha a tempestade!
Trisca relâmpago!
Range bambual!

Gosto assim! [...]
Que desçam as águas
comendo essas margens ressequidas.
Que estremeça a terra
com tuas palavras distorcidas.

Quero essas várzeas alagadas;
esse chão purificado!

Largar-me como um ilhéu
sobre esse promontório
a apreciar a descida das águas...

E depois... Só encontrar recantos ...

(Verdes Versos)

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

FRIDA


Tela

A vagina
ferida
de Frida.

As raízes
expostas
da vida.

Os soluços
perdidos
no escuro.

O fedor
do mijo
no muro.

As costas
viradas
para o Futuro.

O mergulho
no mijo
no escuro.

O fedor
das raízes
da vida.

As vaginas
viradas
para o futuro.

Os soluços
expostos
de Frida.

(que chora)

Verdes Versos

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Haveria ainda tempo?

Hoje resolvi voltar ao ano de 2007 e resgatar um texto que escrevi no dia 23 de dezembro. Podia ter publicado antes, mas ele ficaria esquecido dentre tantas mensagens veiculadas nos Blogs pelos quais todos nós passeamos.


O poeta ... ou melhor, o homem, resolveu despedir-se da poesia e ir encontrar-se com Drummond, na fila do feijão, para tomar uma ducha fria de realidade...
No caminho Sérgio Buarque de Hollanda lhe sussurrou: “ O homem cordial morreu...”
Ressoava, em seus ouvidos, o estribilho: “Noite feliz, noite feliz ...” convidando-o à ceia de Natal.
Mas, pode-se dizer tudo de um poeta, menos de um suposto déficit de memória.
Não! Seria um despropósito ficar garimpando palavras, tendo nos olhos, refletidas: panelas vazias, mãos vazias – vidas definitivamente vazias.
Resolveu então embriagar-se para desfazer-se da realidade.
A certa altura fez um brinde:

– Um brin...de
Um brinde ao homem que vive desfiando seu rosário de insensatez!

Viu-se aí diante de um paradoxo – o Homem. Tão belo ser (estava prestes a se transformar em ferrenho defensor do niilismo), fruto do esmero da evolução, perpetrando a desgraça em um mundo maravilhoso.
Reparou então que, por instante (enquanto não elaborava uma forma mais objetiva de se portar diante da complexidade da vida), cabia-lhe a atitude do verso.
A seu modo então, rabiscou o seguinte verso:

Haveria ainda tempo?

O que o pesadelo
tamborilou no ressonar do Deus,
não foi o bastante;
ele tinha a crença na luz,
que tudo cura.

Toda perplexidade
ficou esquecida
nas curvas dessas horas redondas.

domingo, 13 de janeiro de 2008

SOBRE O QUE SE ESPERA...


Do Poema
Tudo se espera do poema.
Que seja o contraponto da realidade,
o remanso para o repouso do herege,
o inferno permitido para as paixões contidas.

No poema, o que se procura é o ar diferente
que se vai buscar no expirar delirante de um poeta.
Como se o poeta fosse só delírio...
O poema se fez da vida do poeta;
é ele que o espera.

Do Poeta

Nada mais que a diferença.
O ser quase divino que veio ao mundo
tocado pelos deuses.
O que não se percebe, ou pelo menos não
se quer perceber, é que ele só foi tocado pela
contradição humana.
Para quem muito espera do poeta-homem, vale o
conselho:
atenha-se apenas aos seus versos.
Ele é apenas o exemplo típico
da máxima de Nietzsche:
“A arte existe para que o homem não morra da
verdade”.

O que ele faz é apenas acreditar ser um poeta.
O que se deve esperar,
é que essa sua verdade realmente diga algo.

Do encontro entre o Poeta e o Poema

Que da simplicidade do artesão
resulte a palavra-arte.
E esta deixe para trás o homem
e siga sua trilha para a eternidade.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

01 de janeiro de 2008


Após o pão e circo,
sigo em busca da ciência de desinventar.

No vazio do salão amanhecido
ainda ressoam os ecos das champanhes,
os alaridos esperançosos,
os sussurros de cumplicidade.

De sólido,
ficaram os confetes e serpentinas,
que nada entendem da solidão.

(Para não dizer que não falei...)



Recomeço,
e essa sombra de hoje
nada diz do homem que fui