sábado, 27 de novembro de 2010

das sombras

A mínima distância
já é um desencontro.

(Vestia seu corpo
com as rendas da íris...)

Restam noites de dilatadas pupilas
a vasculhar indícios do derradeiro gozo.

No horizonte dos lençóis,
a sombra da silueta persiste.

Como persiste os miasmas
dos pés enlaçados.

Só miragem na depressão do leito.
E um em torno de sombras devassas.


Jorge Elias Neto

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Fotografia






Rosto obliquo – velado
Desvio na fenda da fala
Gestos sem crias
Vazias mãos incestuosas
Obscuras manchas
na pele clara
Mãos em posição de intriga
Coto de vela escorrida
nos cabelos de fogo
Ombro suspenso,
derradeiro encosto
Olhar fitando intervalos
Sob um fundo de rosas
o sol posto

Jorge Elias Neto

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Antonio Carlos Secchin

Não, não era ainda a era da passagem
do nada ao nada, e do nada ao restante.
Viver era tanger o instante, era linguagem
de se inventar o visível, e era bastante.
Falar é tatear o nome do que se afasta.
Além da terra, há só o sonho de perdê-la.
Além do céu, o mesmo céu, que se alastra.
num arquipélago de escuro e de estrelas.

(Antonio Carlos Secchin in: Todos os Ventos - 2002 - Ed. Nova Fronteira)

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Romério Rômulo


"vejam bem ” ( para zeca afonso )



é difícil o caminho do corpo,
mais estranho é o caminho do pão.
são estradas, vieses malditos
repisados e feitos à mão.

as estradas do corpo, aventura,
velhas carnes postadas no chão
são estradas ardidas, agrura,
entranhadas no teu coração.

quando o vale da noite ensurdece,
acontece na vida um desvão,
todo o pão se resvala na noite
que te sobra na palma da mão.


romério rômulo, julho/2010

Romério Rômulo nasceu em Felixlândia, Minas Gerais, e mora em Ouro Preto, onde é professor de Economia Política da UFOP. Prefaciou a primeira edição assinada das poesias eróticas de Bernardo Guimarães, “O Elixir do Pajé” (Dubolso, 1988), mais de 100 anos depois da edição original. Já publicou diversos livros, como “Só pedras no caminho pedras pedras só pedras nada mais” (Lemi, BH, 1979), “Anjo Tardio” (Edição do Autor, Ouro Preto, 1983), “Bené para Flauta e Murilo” (Edições Dubolso, Sabará, 1990) e a caixa “Tempo Quando” (contendo 4 livros em 2 volumes, Dubolso, 1996). Seu último livro é “Matéria Bruta” (Altana, SP, 2006). Atualmente, prepara um livro de poemas sobre o amor.



Contato: romerioromulo@hotmail.com