Ilustração: Felipe Stefani
Não tirem do poeta a visão;
podem condená-lo à loucura
do mergulho no poema sem fim.
I
O poeta sabe a textura exata do sonho.
E por perceber que os números são símbolos
que poderiam arrastar seu povo,
foi o primeiro a se equilibrar nos destroços.
Não azulava as dúvidas com preces
e entendia a sujeira como um vício da realidade.
Caminhando em silêncio,
observou que a ausência de espaço
não havia poupado nem mesmo as sombras.
Homens desencontrados
cruzaram o limite da incerteza
e bradavam:
– Não pedi esse conflito.
Mas, na dúvida,
deixo a arma engatilhada!
Nunca foi do poeta o primeiro momento...
II
Aos primeiros que o ouviram disse:
– Se abuso daqui à esquina de minha casa,
perco o controle do dia.
– A vida é ritual de pontes.
Vejo triste que, entre o dito e o pensado,
ficou uma ponte tombada.
– Hoje massacraram nossas verdades,
e enxergamos o abismo.
Choraram juntos a mais temida das mortes.
III
O poeta sente o absurdo do tempo humano.
O homem aquietará.
E juntos, todos os ponteiros
deixarão de ter sentido.
É do homem buscar refúgio nos dias.
IV
Nos escombros,
na esquina antes sem luz,
sentaram as crianças.
Diante delas
o poeta circundou com o dedo
seu corpo na areia.
Com um salto
surpreendeu-as com a facilidade
que superou o limite de sua prisão.
O poeta percebe o momento exato do nascimento do sonho.
Jorge Elias Neto
(Rascunhos do absurdo - 2010)
sexta-feira, 23 de setembro de 2011
Sonho no absurdo
Postado por Jorge Elias às 10:27 PM
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