O QUE SOMOS
Críticos dizem do poeta:
Um lavrador da memória.
Sim, certamente é isto, pois
dos nossos comos e ondes
só sabemos quando, diante
de nós mesmos, recordamos
nosso enredo nas batalhas,
as bandeiras, as mortalhas,
as trevas, as claridades,
os olvidos, as saudades...
Aqui, o riso. Ali, a dor.
E o amor. E o desamor.
Mas sabe o poeta das sendas
da alma de névoas e lendas
que, em meio ao que de nós vemos,
pode contar outras glórias
vindas de acordes profundos
que tecem, na história, estórias
(quase sempre onde ficamos
melhor: no que fabulamos).
Enfim, o que todos somos
é só o que até hoje fomos,
ou que sonhamos que fomos
(e então sonhamos que somos...)
E assim vai singrando a vida,
rumo ao indesejado cais.
E vamos nós, nessa ida,
levando tudo o que somos:
as ficções da memória
e o que já não somos mais ...
OUTRO ANIVERSÁRIO
Sessenta e cinco navegações
completas
em torno do Sol.
Tudo vazio onde prometeram
fulgurantes legiões
de anjos.
Nenhum deus
a não ser a lembrança dos que morreram
na alma
nm a um
belos ou hediondos
durante a viagem.
Sessenta e cinco vezes
a volta ao Sol
e nenhuma revelação
nenhum sentido
nada
além do cultivo de uma sombra
cada vez mais longa
no ouro agonizante
da tarde.
ESPINHEIRA FILHO, Ruy. In: Sob o Céu de Samarcanda. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil Editora,2009.
sexta-feira, 9 de julho de 2010
RUY ESPINHEIRA FILHO
Postado por Jorge Elias às 7:56 AM
Marcadores: Ruy Espinheira Filho
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Um comentário:
Um grande poeta!
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