sexta-feira, 8 de maio de 2009

Mãe


Pubis Matris

Concepção

Há algum tempo,
tu me excitaste o ventre,
me beijaste os seios,
mergulhaste em meus cheiros
com tua sanha de homem faminto.
Roçaste teu rosto e teus lábios
ensandecidos, em meu púbis

Deixei tatuadas em tua pele
as frases desconexas dos meus gritos.

E eu te recebi sobre mim
para te dar a essência de meu gozo.
E tu deixaste dentro de mim a casual
essência de nosso futuro.

A meio caminho,
no escuro de minha intimidade,
partes de nós fundiram-se.

Gestação

Há pouco tempo,
chegaste mais tranqüilo
e buscaste como um filho,
o calor de minhas coxas.
Tua mão, agora, sem desejo,
cruzou por meu púbis, só de passagem,
e quedou-se, mansamente, sobre meu ventre.

O parto

Há minuto,
éramos eu e ela que discutíamos o instante.
Eu a convidava, alternando gritos e sussuros,
Sua resposta me chegava como ondas de um frenesi crescente.
Nos momentos de silêncio,
que, pouco a pouco, me pareciam eternos,
eu quedava exausta entre teus braços.

Enquanto isso,
tu oscilavas entre altismo
e perplexidade.
Mas, enfim, tu te mostravas com a lucidez de meu amante.

Existia, sim, uma outra mão, um outro olhar,
a observar este nosso momento.
mas ele soube do sentido de tua presença
e manteve-se a uma distância segura
para dar cabo do meu desespero.

No momento presente,
- Ah, momento eterno!!!
Sopro o suor que me chega da testa
dispo-me das máscaras venezianas
sou fêmea parideira.
-Venha, minha filha sentir a luz !
Sinta já que a verdade é dura,
que se luta pela vida,
sinta o nosso amor.

Ela me pressiona o púbis
como que a abrir uma porta
que há pouco, jamais se abrira.
Olho dentro de mim,
vejo aqueles pequenos olhos
que só entendem da simplicidade da escuridão;
eles estão fechados, voltados para as suas poucas certezas.
Mas o instinto rompe a tênue membrana
e derrama, através de mim, o seu mar de segurança.
Seu corpo se expande como que por milagre, e ocupa
espaços que até há pouco eram só meus...
Pela primeira vez me vejo a empurrá-la para o futuro.
Entendo, então, o sagrado.
Mas esse momento fugaz de consciência
esvai-se com a dor.
Eis-me a sentir a dor do parto,
dor sem volta.
Não seria esse o preço da consciência da dor?
por que esta autocomiseração humana?
falta-me a resignação animal.
Mas esta dor não dá tréguas para reflexões filosóficas.
Concluo que, felizmente, sou um animal com acesso à ciência.
Essa dor chega a ser “ desumana¨.
Vamos, filha, que eu te ajudo.
Parteiro, por favor me ajude!!!

O corpo daquela mão
se aproxima e ela manobra
o ser contorcido em que me transformei.
Relembra-me os fins
com sua voz
pontuada de serenidade.

Agora já não falo,
já não penso,
somente a dor
com algo mais... que se dissolve no ar,
que me esvazia a memória
ao mesmo tempo que vejo
ser esvaziado meu corpo.
Talvez um registro iconográfico possa dizer por mim...

E ela surge tímida,
como uma atriz que olha a vida
por detrás de cortinas semi-abertas.
Teme a estréia.
Mas parte para decifrar a luz...

(Neste momento, o poeta se despe do manto lírico e se cala. Já não pode mais se aventurar
com palavras onde o mistério da vida só se faz claro para uma mulher)


(Verdes Versos )

3 comentários:

josé alberto mar disse...

Belo poema, pois
Boas continuações

(Assunto: Alteração de morada do EU CÁ VOO CAMINHANDO"
(http://eucvoocaminhando.blogspot.com)

abraços

j.a.m.

Oliver Pickwick disse...

Gênese e Exodus. Apócrifos.
Aviso: Não tem certificado de garantia do Vaticano e nem do Sinédrio.
Um abraço!

Anônimo disse...

Absolutamente origal sua maneira de dizer um momento tão profundo de mistérios. Lindo! Fiquei emocionada.

Abraço marilena soneghet